sábado, 9 de janeiro de 2010

A convenção dos cornos




por Vertigo



Ser corno na maioria das vezes é um estado que não requer nenhuma vontade. O sujeito dorme e, sem perceber ou querer, acorda corno no outro dia. É como uma virose que faz com que o cara, do nada, amanheça resfriado. Claro que existe a minoria que tem a fantasia de querer ver sua mulher dando para o pedreiro ou pro personal trainning e faz de tudo para que a esposa aceite suas taras de corno manso. Depois de saber de tantos casos e de ler tantos relatos sobre os mais variados gêneros de chifres, resolvi visitar, a título de curiosidade, um grupo de auto-ajuda exclusivo para traídos, tipo estes que existem para alcoólicos anônimos e para recuperação de viciados em drogas. Trata-se do Grupo de Ajuda que Liberta com Harmonia e Amor ou, como é mais conhecido, o Galha.


Descobri o Galha por acaso, através de um amigo que passou a freqüentá-lo depois que flagrou a mulher com outro na cama. Pior foi descobrir em seguida que ela trabalhava como prostituta de luxo fazia mais de quatro anos. Ele era farmacêutico e sua mulher contribuia com o orçamento da casa fazendo salgadinhos pra festas. Mas o padrão de vida deles era colossal: carro importado, casa luxuosa, viagens. Desconfiou e desenterrou a verdade. Não se separou para não perder a boa-vida (ele não era trouxa), mas entrou para o tal grupo justamente pra tirar o grilo, ou o chifre, da cabeça.


A portaria do Galha é bem sugestiva, com uma cabeça de touro empalhada pendurada na porta. Para manter a privacidade, não existe atendimento físico na recepção. O corno adquire um cartão com o responsável pela instituição e o passa na máquina e esta libera a entrada com uma mensagem sonora: “bom dia! Hoje é mais um dia rumo à sua liberdade. Com harmonia e amor venceremos os chifres e deixaremos as mágoas para trás”. Visitantes podem entrar sem o cartão, pois têm direito a uma visita para conhecer o ambiente. Ao entrar vi alguns homens e suas mulheres sentados em círculo. O clima era de resignação.


- Bom dia, meu nome é Argeu. Todos aqui já me conhecem, mas para quem é novato,
sou um dos terapeutas do Galha.


Argeu era um sujeito magro, alto, cavanhaque grisalho. No braço esquerdo tatuagem de
pelo menos cinco nomes femininos diferentes. Sempre que falava mexia com as mãos, como se quisesse fortalecer os conceitos que proferia.


- O senhor aí de camisa listrada cor-sim cor-não, o senhor é visitante? – perguntou para mim.


- Sim.


- Qual seu nome?


- Norberto.


- Já foi ou está sendo traído, Norberto?


- Eu diria que provavelmente ainda vou ser.


- Muito bom. É assim que se fala, pois compreender que todos traem e são traídos é algo totalmente natural. Como sempre digo, metade das pessoas admite o chifre e a outra metade ainda não descobriu que o levou. Sente-se.


A reunião começou com um gorducho falando sobre a aceitação que tinha com o chifre.


- Minha mulher me trai já há alguns anos e eu até incentivo, pois é uma fantasia minha. Mas de uns tempos pra cá eu tenho tido problemas, já que seus amantes não só transam com ela como também estão bebendo minhas cervejas, usando minhas roupas e um já até mijou dentro do aquário lá da sala.


- Realmente é um caso sério o do seu Gilson. Premissa máxima de boa conduta de um amante é saber enxergar o limite de sua atuação. Isso implica em não usufruir além do corpo da mulher do corno. Mijar no aquário é o fim da picada mesmo. Recomendo que o senhor peça o telefone do sujeito para sua esposa e dê um esporro nesse safado.


- Quem mais vive situação parecida?


Um cabeludo levanta o braço:


- Eu. A minha esposa faz orgias nababescas lá em casa. Nessas ocasiões ela dá para alguns homens ao mesmo tempo. Eu não ligo pra isso, mas de uns tempos pra cá os caras começaram a passear com meu carro. Outro dia precisei ir pro trabalho de bicicleta, porque minha mulher tinha viajado com um desses seus amiguinhos não sei pra onde.


- É chato isso. Temos que pensar em soluções para esse tipo de absurdo. Esconda a chave do seu carro e não abasteça sua geladeira com alimentos afrodisíacos. Ele perceberá sua insatisfação e voltará a respeitá-lo.


Um magrelo veio com uma pergunta que eu também tinha curiosidade:


- É verdade, sr. Argeu, que dizem que ser corno é só um passo para ser viado?


- Olha, Demerval, existem poucos estudos sobre isso. A psicologia não ratifica essa assertiva.


- É que um amigo meu começou permitindo que a mulher dele virasse rainha da bateria de uma escola de samba lá perto da casa dele. Daí ela engrenou um caso com o bicheiro dono da tal escola. Da última vez que o vi ele estava parado na porta de uma boate GLS.


- Alguns gays já foram cornos, mas nem todo corno é necessariamente gay – afirmou Argeu.


- Bom, eu queria saber como faço para não ser corno. Vi minha mulher me botando chifres e não admito isso. Não consigo sentir tesão vendo ela transando com o síndico lá do meu prédio. Também não quero terminar com ela. O que devo fazer?


- Eu sugiro que o senhor seja mais maleável. Aceite essa fantasia dela transar com o administrador do seu condomínio. O ciúme diminuirá e você ainda vai poder curtir a sauna do seu prédio sem ficar constrangido com seus vizinhos. Afinal, eles também são chifrudos.


- Não! Eu não aceito! Mesmo que ela fosse mais discreta e deixasse de dar pra ele na portaria eu ainda assim não aceitaria isso. É um descaso. Se eu não amasse tanto a Ângela, terminaria tudo e sairia do condomínio.


- Veja bem, o senhor não pode nunca levar o chifre para o lado pessoal. Dizer que vai “terminar tudo”, que vai “sair do condomínio” é típico de alguém sem personalidade. Admita o chifre e viva a relação! Afinal, se a mudança realmente acontecer, ela vai dar também para o síndico do outro edifício para onde vocês forem. Aprenda com a traição, tire proveito dela. Indignação é um sentimento que apenas o corrói. Faça a leitura da situação: síndico significa funcionário máximo do edifício, um indivíduo graduado. Se ela gosta de dar para esse tipo de pessoa é porque ela também vê em você um sujeito altamente capacitado, já que, quando não está dando pro cara, ela está transando contigo.


- É, isso é verdade. E também não posso reclamar muito porque o valor do nosso condomínio caiu consideravelmente, o que é ótimo.


- Pois então. Relaxe. Chifre acontece em todo lugar. Vamos aprender a administrá-lo e colocá-lo a nosso favor. Percebam que assim o stress em casa diminui, as cobranças ficam raras e brigas tolas vão praticamente a zero. E ela ainda deixa você assistir seu canal Playboy em paz. A galhada é, quase sempre, um prêmio pela sua abdicação à possessão.


- Que prêmio? Como posso extrair algo de bom de uma puta galhada que minha mulher me põe na cabeça? Estou é farto! A Jucimara sai com meu melhor amigo, paga o motel com seu cartão que eu sei e até dá o cú pra ele, coisa que não faz comigo.


- Edgar, dar o cú é um assunto que já foi debatido anteriormente. A mulher sente vontade de dar o rabo em situações que geram sensação de entrega proibida. Por isso que normalmente dão para o amante e não para o esposo. Não existe mistério nisso. Perceba que a partir daí ela pode tomar gosto pelo sexo anal. E adivinha quem vai satisfazê-la quando o Ricardão não estiver por perto, hein, hein? Você, seu bobinho!


Então, uma mulher tomou a palavra:


- Eu traio meu marido com uma amiga minha. Ele não desconfia. Devo contar?


- Certamente que sim. O chifre, ainda que homossexual, deve ser de conhecimento para que ele possa entender que você é uma mulher de confiança.


- E se ele quiser participar também?


- Bom, aí é uma decisão que cabe a você tomar. Mas já digo logo: desse jeito não é mais chifre, e sim sexo grupal. Pode haver prazer também, claro.


- Pesquisem na internet e vejam quantas pessoas estão satisfeitas com as puladas de cerca de seus cônjuges. Se auto-intitulam cornos, gostam de ser, adoram esse rótulo. A questão é o corno sair do armário, pois o Ricardão já saiu faz tempo. Congratulem-se com ele, vivam as suas vidas sem remorsos. Entendam que o prazer de seus companheiros não pode ficar limitado. O último censo apontou que 90% dos homens traem ou são traídos. Ou seja, provas claras de que ser corno, no fundo é bom. Esses 10% ou são mentirosos ou ainda não perceberam os benefícios do chifre. Vejam bem que o adultério já foi banido do Código Penal Brasileiro. Trair já não é mais crime.


- O sr. é corno, sr. Argeu?


- Claro. Todos os meus amigos têm a cópia da chave lá de casa para que possam visitar minha mulher quando quiserem.


- E isso não gerou nenhum desconforto para o sr.?


- Ah, sim. Alguns vizinhos começaram a fofocar, dizendo que minha mulher é uma puta e eu um corno. Logo recomendei que eles viessem para o Galha, para que abrissem seus horizontes. Minha filha de 18 anos está seguindo o caminho e também já põe alguns bons galhos na cabeça de seu namorado. O futuro, de uma forma geral é a proliferação irrestrita e harmoniosa do chifre. Meu problema só acontece quando a Silvinha leva muitos rapazes lá pra casa e minha mulher também. Aí tenho que sair, pois o tumulto fica grande.


- E o senhor não se incomoda se uns amantes da sua mulher também resolverem transar com sua filha?


- Bom, isso deve acontecer, sem dúvida. Mas não fico na beira da porta contabilizando quem está comendo quem. Deve-se deixar fluir normalmente. Se minha mulher transa com um universitário o que há de errado? Eu também adoro uma colegial. Sem problemas.


- E o senhor trai também?


- Claro. Muitas e muitas vezes. Eu passo mais tempo com outras mulheres que com minha esposa. E isso ajuda nosso matrimônio a ficar mais bonito. Acabamos nos tornando mais flexíveis e tolerantes.


- Sr. Norberto, o senhor como única pessoa nessa sala que não foi traída ainda, como é viver sem ser corno?


- Ouvindo vocês eu vejo que minha vida é chata mesmo. Transo com algumas mulheres por aí, mas nada fixo, sem raízes. Vejo que isso não está me levando a nada. Penso que vivo uma liberdade não-compartilhada.


Ouvi aplausos e assovios efusivos. Levantei meio atordoado e saí pensando em emprestar minha boneca inflável para alguns amigos. Quem sabe assim eu não estaria dando o primeiro passo para uma vida mais feliz?
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Néon


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