sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Historias de amor- Lucia Czer


Isadora tem dezoito anos. Estuda ainda no Ensino Médio e trabalha no horário inverso na biblioteca municipal. Foi lá que conheceu Andrei. Tipo intelectual, terno e gravata, cabelos alinhados, óculos de grau, semblante meio distraído. Todas as tardes, dava uma passadinha por lá a buscar um livro, devolver outro, tudo sobre antropologia.

A jovem, nas horas vagas, sabendo da preferência dele, ficava pesquisando que livros continham os assuntos que ele buscava, e já o esperava com uma pilha de volumes, devidamente assinalados com marcadores que ela, meticulosamente, escolhia.

Não era sua atribuição, mas sentiu-se atraída pelo jeito carente e tímido dele.

Começaram a conversar, trocaram idéias sobre o que gostavam de ler. Ela já nem cobrava a taxa dos empréstimos, feliz por poder agradá-lo. Outro dia, ao sair do expediente, Andrei a esperava nos degraus da saída.

- Olá, vou levá-la para uma Coca, pode ser?

Ela enrubesceu, gaguejou, afogueou-se.

- Eu? Claro... Mas você pode ir? Não vou atrapalhar?

- É o mínimo que posso fazer para agradecer tudo que tem feito para me ajudar.

Havia uma lanchonete próxima e para lá foram, a princípio, ela toda encabulada, depois foi descontraindo, sorria, mexia a cabeça afirmativamente ouvindo ávida a conversa dele.

Depois, as saídas para um lanche foram se sucedendo. Não demorou, ela estava totalmente apaixonada. A tarde custava a passar, ansiando pela hora em que se encontrariam. Ficou distraída, nervosa, meio aérea, já quase não atendia bem aos freqüentadores da biblioteca, de tão envolvida por Andrei.

Meses se passaram até que Andrei, ao buscá-la, revelou que, após a formatura, teria que ir embora. Na outra cidade, esposa e um filhinho de dois anos o esperavam.

Isadora não chorou. A dor e a mágoa eram tão fortes que secaram o pranto.

- Quando será a formatura? (Ela perguntou só para certificar-se porque, sem que ele soubesse, ela sonhara com esse dia, e o vestido de festa já a esperava em seu cabide)

Vira-se, muitas e muitas vezes, entrando no teatro ao lado dele em direção ao palco para entregar-lhe o diploma.

Vinte e três de dezembro. O calçadão em frente ao teatro da cidade estava superlotado, homens de preto e marinho, mulheres exibindo-se em múltiplas cores e matizes. Seda, casemira, cetim, rendas, sapatos envernizados e saltos...

Atrás da esquina, um vestido rosa velho de cetim, com duas rosas no ombro, espiava, coração quase a saltar do peito. Viu chegar a Blazer branca e dela desceu a jovem morena, menino no colo, sorrisos, felicidade transparecendo. Andrei e a esposa encaminharam-se para o prédio de braços dados.

Como um autômato, Isadora saiu a caminhar, atravessou a rua principal, nem olhou para os lados. Um baque surdo, um corpo no chão, sangue ao redor... Fim de uma história de amor.



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Gisela é uma bela mulher de trinta anos. Arquiteta de sucesso, tem seu escritório no centro comercial da cidade. Elegante, vistosa, moderna, usa boas roupas, sapatos e bolsas caros, dirige seu carro importado, segura e independente.

Nesse dia, Gisela foi atender a uma consulta numa grande empresa construtora. Se fechasse o negócio, estaria com recursos para adquirir a sua sonhada cobertura. Seriam vários milhões a mais. E ela estava confiante na sua competência.

Ao chegar, nem precisou esperar, a recepcionista levou-a em seguida ao escritório do chefe. Gisela teve agradável surpresa ao deparar-se com o homem executivo. Maduro, de uma elegância máscula e sofisticada. Cheirava bem, cabeleira farta, porte atlético.

Depois dos acertos comerciais, ele a convidou para almoçar. Gisela lembrou que tinha combinado um almoço com a mãe, mas pensou: “- Será por uma boa causa...”

A conversa foi deliciosamente descontraída, flertaram abertamente, ela sem nenhum pudor. Já não tinha idade para joguinhos amorosos. Dali, para o motel, foi apenas um pequeno passo. Passaram a ver-se frequentemente, sem promessas nem acertos, sem planos de futuro, mas vivendo o que de bom o momento podia oferecer.

Aos poucos, a separação depois do amor foi incomodando Gisela. Queria mais, queria dividir com ele o edredon, o travesseiro, dormir no braço dele, acordar com o beijo dele... Discutir coisas como a pintura do apartamento, a madeira da escrivaninha, o livro, o quadro...

Nelson era muito ocupado. Concentrava todo gerenciamento da empresa em si mesmo, e aí quase não sobrava tempo para a relação dos dois. Gisela começou a sofrer. Primeiro a ansiedade, depois telefonemas insistentes, as cobranças. Deixou o grupo de amigos, parou de sair, nem cinema nem barzinhos. E vieram noites solitárias sem que Nelson aparecesse.

Ontem Gisela resolveu ir, fora de horário, na empresa a ver se Nelson destinava-lhe algumas horas. Não ligou nem avisou. Chegou de súbito. Abriu a porta sem bater, Nelson e a secretária trocavam beijos ardentes, a saia da moça erguida deixando-lhe as coxas à mostra, na escrivaninha, uma calcinha de tecido tigrado.

Gisela deu meia volta. Caminhou resoluta sem atender aos chamados de Nelson. Saiu do prédio e aspirou longamente o ar, tentando recobrar a calma. Enfiou a mão na bolsa, pegando o celular. Olhou a agenda, discou:

- Sérgio? Gisela! Tudo bem? Tem a noite livre? Que tal um happy hour lá em casa?

Desligou satisfeita. Assim, fechava-se mais uma história de amor.



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- É cinco contos... É pegar ou largar, dona! Serviço de primeira, le asseguro que o boy nem vai sentir dor.

Ela pegou o talão de cheques e preencheu-o, estendendo-o em direção ao homem. Ao pegar, ele roçou a mão roliça de dedos curtos e nodosos, ela teve um frêmito de nojo. Quase se arrependendo de estar ali.

Na mesa do bar na Avenida Litorânea, estava uma foto de Rodrigo, ele recostado na cadeira de metal vermelho, calças bege, camisa pólo branca, sapatênis. Mais uma vez, ela reparou no tamanho da bainha da calça dele, sinal do desleixo.

Havia mais dois homens com o baixinho: um exibia um anel com pedra vermelha, a unha do dedo mínimo mais longa que as outras, palito no dente. O outro, tinha um nariz fino e aquilino e deixava entrever-se, sob o casaco, o volume da pistola escondida.

Maria Tereza nem tocou na cerveja que Rosilene, a garçonete, tinha servido, sentia o estômago meio embrulhado enquanto o grupo comia um arroz de cuchá com muita vontade e nenhuma cerimônia. Só queria estar o mais longe possível daquele trio. Alcançou para o baixinho, um mapa feito por ela com o trajeto que Rodrigo usava fazer da casa até o colégio onde dava aula.

Relembrou o dia em que se conheceram:

Maria Tereza dava aulas na universidade no departamento de Línguas e Literaturas. Quarenta e cinco anos, divorciada, filhos criados, resolvida financeiramente.

Entre uma aula e outra, foi tomar um suco no barzinho onde se reuniam alunos e professores durante os intervalos. Com a unha pintada de vermelho, traçava círculos sobre o vidro da mesa com o suor do copo gelado. Viu a sombra do rapaz diante dela e levantou os olhos.

- Oi, olá, sente... Fique à vontade, já estou de saída.

- Por favor, “profe”! Queria falar com você. Pode ficar?

Meio relutante, ela ficou. Ele falou, falou, falou, ela já nem lembrava sobre o que. Só via os olhos castanhos meio míopes atrás das lentes, o cabelo rente, o corpo desengonçado, meio acima do peso. Era sobre Gonçalves Dias, ele mais que perguntar, afirmava e ela assentia com a cabeça, já meio tonta com o barulho. Percebendo, ele a convidou para andar e assim, saíram para o jardim, sentaram-se em um banco sob as árvores. A conversa foi tomando um rumo mais pessoal. Daí a pouco ela já soltava uma risada gostosa, satisfeita com o jeito humorado dele.

Depois disso, vieram muitas e muitas vezes em que se encontraram, até que ele mudou-se para a casa dela. E viveram um caso de amor como em romances e novelas. Ela, madura, ele jovem e apaixonado. Ela usufruiu toda a juventude que ele podia dar-lhe. Ele gozou do que a maturidade e independência dela, podiam oferecer-lhe.

Chegou o final do curso, ele viajou, as conversas foram se espaçando. Até que um dia ela perguntou pelo msn:

- Me ama?

A resposta foi:

- Não mais!

Depois disso, Maria Tereza encontra-se aqui, tratando com o grupo de mal encarados.

Pos o dinheiro para pagar a conta sobre a mesa e saiu sem se despedir. Entrou no carro e deu partida, seguindo até a Avenida São Luís Rei de França.

No entroncamento com a Avenida dos Holandeses, diminuiu a velocidade e emparelhou o ford Fusion prata com o Fiesta vermelho, ano 2004. O rapaz negro dirigindo o carro, com o alto som das caixas acopladas na mala do carro, fones ao ouvido, nem reparou nela. Ela deu sinal de luz com os faróis, sentindo um leve remorso. Ele nem prestou atenção.

Ela deu de ombros, olhou para o banco ao lado certificando-se de estar com o passaporte e as passagens aéreas, para Portugal, na bolsa.

- Que seja!

Rodrigo e Maria Tereza seguiram caminhos opostos. Cada qual seguiu ao encontro de seu destino...

No bar à beira da avenida, os matadores de aluguel aguardavam...

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Néon


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