quarta-feira, 10 de junho de 2009

Vertigens de um recomeço



por Vertigo


Difícil transformar em um conto simples os acontecimentos que vivi, o fim e o novo início, a morte emocional junto de uma pessoa e a ressurreição com uma outra mulher incrível, que também conseguiu superar sua chaga, revelando-me, por fim, o verdadeiro significado do prazer. Apenas sob o manto da metáfora foi possível sintetizar tantos acontecimentos em uma única passagem, tão angustiante quanto renovadora.


Dizem que se o sol morresse agora viveríamos ainda em sua presença por mais alguns instantes, suficientes para que nosso padecer ocorresse sob luz. Nágila não era mais meu sol, talvez nunca tivesse sido como queriam me fazer acreditar, mas meu sofrimento sim, esse era meu, verdadeiro.


“Esquece essa mulher, cara, ela nunca foi sua”. Porque não? “Porque ela nunca teve o mesmo coração que você. Ela te enganou, te trocou por outro, te abandonou. Enxerga o mundo, Giovane! As pessoas são ardilosas, mal agradecidas, vazias”.


Alguns diziam que minha ingenuidade me impedia de entender a palavra ‘traição’. Mas porque eu deveria entendê-la? Eu vivia bem sem ela. Eu só não vivia bem sem Nágila. Não me adiantavam as ocas teorias dos poetas, psicanalistas, amigos, doutores, mestres em dores da alma, repulsas, vertigens, assuntos que só o verdadeiro coração dilacerado domina. “Ela te traía com um cara na cidade”, “essa menina nunca foi o que você imaginava, ela era interesseira”. As vozes em alarme zuniam em minha cabeça como açoites, castigo que eu recebia sem saber por quê. Nunca quis acreditar em indícios, em palavras racionais, sempre aceitei melhor a inocência das emoções. Por isso talvez só o que restasse pra mim fosse só a possibilidade de um recomeço, o mesmo que Nágila já experimentava. Eu também tinha esse direito.


Os tristes ipês me escoltavam por aquele caminho de terra vermelho-sangue até à Cachoeira da Vertigem, local de nome sugestivo, pertinente aos espíritos aflitos. O canto dos pássaros soava cinza com seus réquiens indiferentes à infelicidade humana. Recomeço. As cigarras e seus silvos tão fortes quanto breves explicavam esse verbo usado por Nágila. Ela precisou recomeçar. “Quero uma vida diferente agora, não aqui no campo, nesse lugarejo”. “Ela está te trocando por um sujeito da cidade, todos sabem”. “Eu te amo, Giovane, mas quero conhecer outros mundos”. “Só ficou contigo enquanto isso era útil, enquanto você pagava seus estudos com o dinheiro suado do trabalho na fazenda”. “Vou para a cidade, vou fazer um curso, passear pela praia”. “Ela tem um caso por lá”. “Meu coração é seu, você sabe”. “Nunca mais vai voltar”. “É só um recomeço”. “É o fim”. Explicações frágeis brotavam de todas as partes como num embate por vitórias fracassadas, sem sentido, sem uma razão que curasse minha ferida.


Se meus amigos enxergavam o mal, eu os compreendia, queriam meu bem. Se Nágila mentia, eu estava ali para ouvir, tolerar, mesmo que todos esses truques só servissem para eliminar o obstáculo final para o seu reinício, eu. Fui excluído de sua vida para que suas ambições urbanas aflorassem, crescessem da forma como ela queria, sem cheiro de mato, sem céu de estrelas, sem água da pedra, sem meu sorriso por vê-la. Muito provavelmente amar incondicionalmente fosse isso mesmo, permitir ao invés de questionar, libertar antes de exigir, recomeçar para não entristecer.


O barulho da cachoeira já refrescava meus pensamentos. Perto de um dos cantos do lago observei minha própria imagem na superfície trêmula e vi um homem compreensivo com sua angústia. Dei um sorriso, coisa que não fazia há algum tempo. Com as mãos banhei meu rosto e procurei admirar a grandiosa queda d’água. Impressionante como a Vertigem estava mais densa, mais próxima de um cenário natural e não de um sonho. Ela possuía a peculiaridade de ser sempre interpretada pelo capricho crítico de seu admirador. Era o colírio de turistas e espaço lúgubre para os mal intencionados. Casais apaixonados a tinham como um paraíso terrestre, enquanto que para solitários era o ombro companheiro. Não era raro amantes eufóricos subirem até o cume da rocha principal para declamarem o amor por suas mulheres, atitude essa potencialmente valorizada pelo perigo daquela área, pois ali um pequeno deslize poderia ser fatal. Imerso em meus devaneios eu acreditava ter como únicos confidentes as folhas das palmeiras e a brisa serena.


Foi quando notei na parte direita de uma das pedras um vulto feminino. Agucei o olhar e percebi que era Nínive, uma moça que, assim como eu, também morava e trabalhava na região. Nunca a reparara bem porque até então meus olhos só se serviam de Nágila, mas sabia que ela era noiva de um fazendeiro das adjacências. Procurei decifrar o que ela fazia sozinha ali, já que até para experientes guias aquela parte da cachoeira era muito traiçoeira. Acenei com as mãos. Ela viu, mas não respondeu. Seu rosto denunciava uma chaga na alma, uma tristeza semelhante a que eu despejara no lago minutos atrás. Um pânico atroz dominou minhas ações quando vislumbrei em seu semblante uma intenção de autodestruição.


Corri por entre a mata lateral, escalando aos pulos e tropeços robustas pedras escorregadias, alheias ao desespero da situação. Gritei para que ficasse parada até minha chegada, ouvindo como resposta apenas o eco de minhas próprias súplicas. Ao chegar perto de onde estava Nínive pude me certificar do risco real que sua vida corria. Ela estava descalça na parte onde a incidência de lodo era maior, sem nenhum apoio para as mãos. Sua expressão carregada de mágoa evidenciava claro desejo de morte. A primeira coisa que fiz foi pedir para que ela não se mexesse. Chorando ela disse em lamúria para que eu não me intrometesse em sua vontade. Fiquei agachado o mais perto possível de onde estava, num ângulo inferior, amparado pelo galho de uma árvore, com o braço estendido. A água fria fluía forte por entre seus pés.


– Nínive, olha, não conheço sua vida nem sei o que te trouxe até aqui, mas se você fizer isso a vitória será dos seus problemas, não sua.


Sua cabeça não levantou e seus olhos permaneceram namorando o precipício.


– Eu não quero vitória, Giovane. Eu só queria que respeitassem meus sentimentos. Mas não adianta... Quem é você para entender alguém abandonado pelo amor?


– Talvez alguém que também tenha sido.


A moça ergueu a cabeça e finalmente nossos olhares se cruzaram. Uma fina chuva começou a cair sobre a Cachoeira da Vertigem. O risco de queda aumentava a cada segundo. Nínive comentou sobre o motivo da decisão derradeira.


– Meu noivo me largou para ficar com minha irmã. Tiveram um relacionamento durante meses sem que eu soubesse.


– A mulher que eu amava foi embora para a cidade. Disse que tinha várias ambições, mas eu não estava incluído em nenhuma delas. Meus amigos contam que ela me trocou por outro.


– O apoio de meus amigos não serviu para juntar meus pedaços. O Arnaldo e a Cíntia foram embora e me deixaram aqui, morta.


– Você não está morta. Oportunidades aparecem a cada momento para que possamos viver o que ainda não vivemos – disse mantendo o braço esticado para que ela o segurasse.


Nínive relutava em receber a ajuda. As gotas da chuva se confundiam com as lágrimas em seu rosto. Um de seus pés derrapou.


– Segure minha mão. Vamos conversar um pouco aqui. Só estou pedindo um minuto! Nem é tanto tempo assim.


Finalmente Nínive cedeu e segurou meu braço. No momento em que sua perna buscava apoio na parte seca, escorregou. Segurei-a com força enquanto ouvia seus gritos cortando o ar. Com alguma dificuldade, abracei seu dorso e a puxei com firmeza para, então, cairmos entre as árvores, salvos. Olhei com muito afeto para seu rosto afogado em medo e desilusão. Seus cabelos molhados deixavam expostos apenas parte de sua face de traços angulosos, o suficiente para perceber o quanto era bela.


– Por que as pessoas fazem isso com quem as ama? – indagou Nínive querendo uma resposta impossível.


– Não acredito que seja por ódio. Pode ser egoísmo, mas quem não é egoísta? Eu queria Nágila, ela queria ouras coisas. Talvez um dia ela também queira algo que não possa ter. Acho sinceramente que na vida podemos ter tudo o que almejamos, só que existem coisas que não deveríamos almejar.


– Não! As pessoas não se preocupam com o sentimento de quem as ama de verdade. Mas e daí, né? O que vale é seguir seu caminho, independente do sofrimento que se vai causar em quem se doou por um relacionamento, em quem foi seu amante. ‘Seja feliz’, esse é o lema. Engraçado como eu queria que todos fossem felizes: meu noivo, minha irmã, meus amigos. Mas e a minha felicidade? Sei lá onde ela está. Deveria estar ali embaixo agora, junto das pedras, mas nem isso você deixou.


O pranto de Nínive era tão sincero quanto minha vontade em eliminá-lo. Involuntariamente a moça apoiou sua cabeça em meu ombro, soluçando. Afaguei sua cabeça com carinho verdadeiro, procurando aliviar sua dor. Suas mãos juntas escondiam a face de uma vergonha que não era dela.


– Sabe, Nínive, eu amava tanto minha namorada que agora fico feliz em saber que ela foi embora.


– Como assim?


– Se ela está realizada com outra pessoa na cidade, por que eu deveria ficar triste? Acho que amar de verdade é querer ver o outro sempre feliz, estando ou não do nosso lado.


Os olhos de Nínive fixaram-se nos meus. O sentimento de fim que havia neles evaporava, cedendo espaço a interesses vívidos. Seu equilíbrio voltava ao normal fazendo com que percebesse a insanidade de seu ato no alto da Vertigem.


– Nem sei o que fazer para poder me desculpar pelo que fiz você passar – disse ela olhando o ferimento em minha perna ocasionado por uma pedra.


– Se você sorrir já vai bastar.


Um tímido sorriso emergiu sincero em seu rosto, convidando sua beleza a sair do anonimato. Seus olhos castanhos brilhavam como se dentro orbitassem pérolas. Pude sentir sua respiração quente muito próxima de mim. Como ímãs, nossos rostos foram se aproximando até que nossos lábios se tocaram. Um sabor fresco, de vida intensa, aportou em minha boca. Havia tempo que não sentia o gosto de uma mulher, sendo que nos últimos anos a única boca que provara havia sido a de Nágila. Tudo, desde os beijos aos abraços cobertos de luxúria, foi se tornando mais ardente, gostoso, enquanto nos revirávamos sob o agora lascivo ruído da queda das águas. Impressionava como a vida poderia nos surpreender com situações tão antagônicas, destino que, de um terror profundo, se transformava em vibração positiva, desejo, plenitude.


Sua língua seguia ampliando seus domínios, conquistando agora meu pescoço com uma vontade inequívoca. Num gesto brusco e surpreendente terminou de rasgar minha camisa. A blusa de Nínive, completamente encharcada, mais revelava do que escondia os seus rijos e sensuais seios, sedentos pelo conforto de minha boca. Toda sua extensão de pele se tornava um vertiginoso caminho que minhas hábeis mãos percorriam sem constrangimentos, como as águas daquela cachoeira que desciam íntimas pelos sulcos das rochas. Minha amante descia por meu corpo, beijando meu peito, deslizando sua língua por meu abdome, mostrando uma vontade incontestável, delírio próprio de quem renasce para o prazer. Ao abaixar minha bermuda, segurou o pau com uma inocência mascarada pelo desejo selvagem de chupá-lo. Meu corpo foi inundado por uma sensação maravilhosa. Fazia com suave cadência, liberando sua língua com precisão para que nenhuma parte da glande ficasse sem sua saliva. Logo tudo sumia harmoniosamente dentro de sua boca, causando-me mais que vertigens, aquilo me fazia transcender. Numa comparação instintiva ficava nítido a enorme diferença entre a densa performance de Nínive e a agora perceptível displicência de Nágila.


O ritmo, o manuseio, os olhos fechados destilando malícia, esse era o estilo campestre de duvidosa ingenuidade de Nínive que, com sua sublime formosura, gerava uma excitação explosiva dentro de mim. Segurei seus cabelos, colocando-os de lado para que melhor visualizasse aqueles lábios mamando com rara entrega a cabeça arroxeada, ministrando verdadeira aula de sexo oral. Como Arnaldo poderia abandonar uma mulher como aquela?


Abracei-a e a trouxe para baixo de mim, encostando suas costas em um aglomerado de plantas e raízes afofadas pela umidade da chuva. Sorvi cada um de seus seios, dando particular atenção aos mamilos. Sua cintura delicada, o umbigo formoso, os pelinhos loiros que desciam indicando o caminho a ser seguido, tudo naquele corpo parecia esculpido e direcionado para meu tesão. Os fios ruivos daquela bucetinha e seu aroma convidativo se tornaram meu vício, pois quanto mais a sugava menos minha vontade era saciada. A penetrava com minha língua procurando o mais fundo paladar de minha amante, massageando com os dedos a superfície úmida e macia. Ouvia Nínive respondendo com voz baixa que me queria, concentrada, segurando minha cabeça para que dali eu não saísse, sem notar que esse também era o meu interesse.


Uma conexão de sabor indescritível conquistou nossas almas. Eu deslizava visceralmente para dentro de minha amante, saboreando cada espasmo sentido, cada limite conquistado, cada gemido ouvido. Ao tempo em que nos fundíamos, a chuva triste abandonava a cachoeira, dando lugar a um sol discreto, cujos raios luminosos faziam brilhar ainda mais o delicioso colo de minha ninfa. Nágila, a chuva e as lágrimas já eram passado, lembranças remotas, tão esquecíveis quanto cicatrizes antigas. Real era Nínive, seu corpo, sua boca e nosso prazer. Envolvido por suas quentes paredes vaginais, que tracionavam, puxando, esfolando, liberando e recomeçando, eu percebia que o tempo agora era nosso. Instintivamente intensificava os movimentos, pele com pele, suor e lágrimas, que agora eram de alegria e gozo, fluídos necessários em meio aos ecos que vinham das pedras e reencontravam seus emissores.


Entrava e saía com vontade rasgada, irrepreensível, como que se daquilo minha vida dependesse naquele momento. O prazer veio quase simultâneo, vigoroso, devastador. Nínive urrava convulsionada por um orgasmo liberto das profundezas. Permanecemos deitados sem nada falar, até porque tudo já havia sido dito. Pássaros escondidos entre as palmeiras cantavam o renascimento de Nínive que, muito mais que mero prazer carnal, reencontrara uma alegria divina, impregnada de vida.


Naquela cachoeira imaginária, entendemos que o prazer do recomeço tinha o poder de sobrepujar a angústia de nossas perdas.
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Néon


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