Polêmica, irreverente, emancipada. Tais são os qualificativos que mais fortemente marcaram o imaginário construído em torno da figura pública de Patrícia Galvão (1910-1962). Ou simplesmente Pagu.
Apelido que recebeu aos 18 anos do poeta Raul Bopp e com o qual se tornou conhecida nos anos de 1920 quando, ainda colegial, fazia às vezes de mascote do modernismo paulista e de “boneca” do casal Tarsila e Oswald de Andrade.
Essa fulgurante inserção no universo de sociabilidade da vanguarda da época aconteceu antes do romance avassalador de Patrícia com Oswald, do nascimento, em 1930do filho de ambos (Rudá de Andrade) e da entrada deles no Partido Comunista em 1931
Em meio à militância, durante uma greve dos estivadores, em Santos, Pagu é presa e transforma-se na primeira mulher detida por motivos políticos. Em 1933, a escritora publica Parque Industrial, o primeiro romance proletário brasileiro. Por exigência do PCB, contudo, assina a obra como Mara Lobo. Pagu pela importância histórica cumpre o papel de primeira feminista, presa política e porta voz de uma geração reprimida e completamente inexpressiva.
O álbum de Pagu - Nascimento, vida, Paixão e morte.
Nascimento...
Além...muito além do Martinelli...
martinellamente escancara as cento e cinquenta e quatro guelas...
Era filha da lua...
Era filha do sol...
Da lua que aparece serena e suave no céu , amamentando
eternamente o Cavaleiro de S. Jorge...Barrigudinha
Do pai sol, amado D. decorador de quadros futuristas...
O pai dela gosta de bolinar nos outros...
E Pagu nasceu...
de olhos terrivelmente molengos
e boca de cheramy...
E o guerreiro cantou.
E Freud desejou...
Mandioca braba faz mal.
Pagu era selvagem
Inteligente
E besta...
Comeu da mandioca braba...E fez mal.
Pagu / 1929
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UM PEIXE
Um pedaço de trapo que fosse
Atirado numa estrada
Em que todos pisam
Um pouco de brisa
Uma gota de chuva
Uma lágrima
Um pedaço de livro
Uma letra ou um número
Um nada, pelo menos
Desesperadamente nada.
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''É uma necessidade conversar com os poetas. E se os poetas
morrerem,provocarei os mortos,as flores do mal que estão na
minha estante''.
''Sou a única atriz.
É difícil para uma mulher interpretar uma peça toda.
A peça é a minha vida, meu ato solo”.
"Tenho várias cicatrizes, mas estou viva. Abram a janela.
Desabotoem minha blusa. Eu quero respirar...
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"A liberdade e a prisão
Ter um barco que percorra
Distâncias incríveis
Saber remendar um sapato
Encontrar um amor
Amor de verdade
Ser vento, fogo ou carvão
Tudo, tudo, tudoMenos esta ratoeira"
"O que você está falando, menina?
Estou falando que.
Que o quê?
Que.
Vamos dizer que a menina, minha amiga
Pretenderia o quê?
Que."
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Maltus Alem
Excluida a grande maioria de pequenas burguesas, cuja instrução é feita nos livrinhos de beleza, nas palavras estudadas dos meninos de baratinha, nos gestos das artistas de cinema mais em voga, ou no ambiente semi-familiar dos cocktails modernos - temos a atrapalhar o movimento revolucionário do Brasil uma elitezinha de "João Pessoa" que sustentada pelo nome de vanguardistas e feministas, berra a favor da liberdade sexual, da maternidade consciente, do direito do voto para "mulheres cultas", achando que a orientação do velho Maltus resolve todos os problemas do mundo.Estas feministas de elite que negam o voto aos operários e trabalhadores sem instrução, porque não lhes sobra tempo do trabalho forçado a que se tem que entregar para a manutenção dos seus filhos, se esquece que a limitação de natalidade quase que já existe mesmo nas classes mais pobres e que os problemas todos da vida economica e social ainda estão para ser resolvidos. Seria muito engraçado que a ilustre poetisa D. Maria Lacerda de Moura fosse ensinar a lei de Maltus ao sr. Briand, para que ele evitasse a guerra mundial atirando à boca ávida dos imperialistas gananciosos, um punhado de livros sobre maternidade consciente. Marx já passou um sabão no celibatário Maltus, que desviava o sentido da revolução para um detalhe que a Russia, por exemplo, já resolveu. O materialismo solucionando problemas maiores faz com que esse problema desapareça por si.O batalhão '' João Pessoa" do feminismo ideológico tem em D Maria Lacerda de Moura um simples sargento reformista que precisa extender a sua visão para horizontes mais vastos a fim de melhor atuar no próximo Congresso de Sexo.
Pagu, O Homem do Povo, n. 1, sexta-feira, 27 de março de 1931.
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Pagu- Maria Rita
Mexo, remexo na inquisição
Só quem já morreu na fogueira
Sabe o que é ser carvão
Eu sou pau pra toda obra
Deus dá asas à minha cobra
Minha força não é bruta
Não sou freira nem sou puta
Porque nem toda feiticeira é corcunda
Nem toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho que muito homem
Ratátátá
Sou rainha do meu tanque
Sou Pagu indignada no palanque
Fama de porra-louca, tudo bem
Minha mãe é Maria-Ninguém
Não sou atriz-modelo-dançarina
Meu buraco é mais em cima
Porque nem toda feiticeira é corcunda
Nem toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho que muito homem
Ratátátá
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