quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

FILÓ, A FADINHA LÉSBICA-HILDA HILST


FILÓ, A FADINHA LÉSBICA



Poema de Hilda Hilst





Ela era gorda e miúda.

Tinha pezinhos redondos.

A cona era peluda

Igual à mão de um mono.

Alegrinha e vivaz

Feito andorinha

Às tardes vestia-se

Como um rapaz

Para enganar mocinhas.

Chamavam-lhe “Filó, a lésbica fadinha”.

Em tudo que tocava

Deixava sua marca registrada:

Uma estrelinha cor de maravilha

Fúcsia, bordô

Ninguém sabia o nome daquela cô.

Metia o dedo

Em todas as xerecas: loiras, pretas

Dizia-se até...

Que escarafunchava bonecas.

Bulia, beliscava

Como quem sabia

O que um dedo faz

Desce que nascia.

Mas à noite... quando dormia...

Peidava, rugia... e...

Nascia-lhe um bastão grosso

De início igual a um caroço

Depois...

Ia estufando, crescendo

E virava um troço

Lilás

Fúcsia

Bordô

Ninguém sabia a cô do troço

da Fadinha Filó.

Faziam fila na Vila.

Falada “Vila do Troço”.

Famosa nas Oropa

Oiapoc ao Chuí

Todo mundo tomava

Um bastão no oiti.

Era um gozo gozoso

Trevoso, gostoso

Um arrepião nos meio!

Mocinhas, marmanjões

Ressecadas velhinhas

Todo mundo gemia e chorava

De pura alegria

Na Vila do Troço.

Até que um belo dia...

Um cara troncudão

Com focinho de tira

De beiço bordô, fúcsia ou maravilha

(ninguém sabia o nome daquela cô)

Seqüestrou Fadinha

E foi morar na Ilha.

Nem barco, nem ponte

o troncudão nadando feito rinoceronte

Carregava Fadinha.

De pernas abertas

Nas costas do gigante

Pela primeira vez

Na sua vidinha

Filó estrebuchava

Revirando os óinho

Enquanto veloz veloz

O troncudão nadava.

A Vila do Troço

Ficou triste, vazia

Sorumbática, tétrica

Pois nunca mais se viu

Filó, a Fadinha lésbica

Que à noite virava fera

E peidava e rugia

E nascia-lhe um troço

Fúcsia

Lilás

Maravilha

Bordô

Até hoje ninguém conhece

O nome daquela cô.

E nunca mais se viu

Alguém-Fantasia

Que deixava uma estrela

Em tudo que tocava

E um rombo na bunda

De quem se apaixonava.



Moral da estória, em relação à Fadinha:

Quando menos se espera, tudo reverbera.



Moral da estória, em relação ao morador

da Vila do Troço:

Não acredite em fadinhas.

Muito menos com cacete.

Ou somem feito andorinhas

Ou te deixam cacoetes.







Extraído de BUFÓLICAS.



“Todos esses livros estão longe da literatura pornográfica banal e recolhem verdadeiras gemas da matéria baixa, como antes já fizeram em língua portuguesa, autores excelents como Gregório de Maatos, Tomás Pinto Brandão, Bocage, Nicolau Tolentino, Bernardo Guimarães etc. Mais especificamente, Bufólicas é um exercício de estilo que parodia tanto fábulas antigas, com suas histórias de maravilhas que constituem alegorias morais, quanto contos de fadas.

Alcir Pécora




**********




Lobos? São muitos.

Mas tu podes ainda

A palavra na língua

Aquietá-los.


Mortos? O mundo.

Mas podes acordá-lo

Sortilégio de vida

Na palavra escrita.


Lúcidos? São poucos.

Mas se farão milhares

Se à lucidez dos poucos

Te juntares.


Raros? Teus preclaros amigos.

E tu mesmo, raro.

Se nas coisas que digo

Acreditares.



Hilda Hilst



***************




Enquanto faço o verso, tu decerto vives.

Trabalhas tua riqueza, e eu trabalho o sangue.

Dirás que sangue é o não teres teu ouro

E o poeta te diz: compra o teu tempo.


Contempla o teu viver que corre, escuta

O teu ouro de dentro. É outro o amarelo que te falo.

Enquanto faço o verso, tu que não me lês

Sorris, se do meu verso ardente alguém te fala.

O ser poeta te sabe a ornamento, desconversas:

"Meu precioso tempo não pode ser perdido com os poetas".

Irmão do meu momento: quando eu morrer

Uma coisa infinita também morre. É difícil dizê-lo:

MORRE O AMOR DE UM POETA.

E isso é tanto, que o teu ouro não compra,

E tão raro, que o mínimo pedaço, de tão vasto

Não cabe no meu canto.


Hilda Hilst



''Eu sempre me fascinei com o matemático indiano Srinivasa Ramanujan. Ele dizia que para resolver seus intricados teoremas era movido apenas pela beleza das equações.
Na poesia também é assim. É uma espécie de exercício do não-dizer, mas que nos dilata de beleza quando acabamos de ler um poema." (Hilda Hilst)

2 comentários:

  1. Uma fascinante exploração/explosão/exaltação da linguagem erótico-fantástica é o poema da Fadinha Lésbica, um monumento de escrita poética invulgar. Sim, a Poesia Erótica é uma Arte Maior, Hilda Hirst a isto comprova mais do que nunca, assim como todos os poetas eróticos da História comprovaram. É um poema bastante criativo e delicioso de ler!

    ResponderExcluir

Néon


RockYou FXText

Porno Tube